sábado, 9 de abril de 2011
Blog do Zezão: Uece, Uva e Urca fazem manifestação em frente ao P...
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
Uma pedra no caminho da segurança pública do Rio de Janeiro
Os novos rumos da segurança pública no Rio de Janeiro parecem estar caminhando a passos mais longos que os de outrora, principalmente em virtude da criação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) a partir de 2008, inicialmente no morro Dona Marta e estendendo-se atualmente para outras 13 favelas da cidade. Nessas localidades a incidência de homicídios e de trocas de tiros envolvendo traficantes ou milicianos, entre diferentes facções, ou entre a polícia, diminuíram consideravelmente segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado, mesmo que isso signifique uma migração dos criminosos para áreas como Baixada Fluminense, Região dos Lagos, Niterói, São Gonçalo ou a mudança de ramo profissional dentro do crime.
Esta política de segurança pública por um lado mostra-se eficiente na redução da criminalidade nessas áreas, por outro lado, mostra o antro de corrupção e conivência por parte de alguns membros das fileiras policiais, ficando isso latente no caso da ocupação do Complexo do Alemão pelas forças de segurança. Casos como o de policiais que fornecem suas fardas para que os traficantes saiam camuflados do local, por viaturas policiais que levam os fugitivos no calar da noite em seus porta-malas, pela ocupação que por algum motivo “desconsiderou” uma das principais rotas de fuga do local: a rede de esgoto recentemente construída por ações do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC). No entanto estas mesmas forças de segurança tinham em mãos o mapa da rede esgoto quando perguntado por jornalistas.
O Departamento de Polícia de Nova York (NYPD), nos Estados Unidos, tinha se cerca de 22 mil policiais passando a 37 mil policiais ao longo da gestão do Prefeito Rodolph Giuliani, sendo o maior efetivo policial municipal do país, em sua gestão, entre 1994 e 2002, foram demitidos mais de 8 mil policias envolvidos com corrupção e outros crimes segundo Luiz Eduardo Soares, ex-Secretário Nacional de Segurança Pública, paralelamente foi realizado o treinamento de um novo efetivo advindo em sua grande maioria das Faculdades de Direito. O trabalho iniciou-se pelas delegacias de bairros populares como Bronx e Harlem, onde o convívio com o crime era mais tolerado. Essa ação fazia parte da famosa política de “tolerância zero”, onde se punia pequenos delitos em estabelecimento diverso das penas mais graves e com penas alternativas (da assistência comunitária a privação provisória da liberdade). Aliado a isso, houve o fortalecimento do Poder Judiciário, em especial, do Ministério Público, visando garantir a punição de grandes criminosos, que contratavam renomados advogados para seus casos. Houve também o aumento substancial do salário médio dos policiais que atualmente é por volta de 8500 reais. Neste valor não está incluído o pagamento de horas extra nem adicional por trabalho noturno ou em feriados. Somados estes valores ao salário, mais a ajuda de custo para a compra de uniforme, o policial poderá receber até 10780 reais por mês. Essa política conseguiu somente entre 1993 e 1996 diminuir os homicídios de 3000 por mês para 700, sendo o responsável a nível nacional pela redução de 60% dos homicídios em 1997. Mudando o status de Nova York de uma das cidades mais violentas dos Estados Unidos, em 1993, para a cidade mais segura do país, dentre as grandes metrópoles, em 1997, segundo o Federal Bureau of Investigation (FBI).
No Rio de Janeiro, o efetivo das Polícias Militar e Civil é cerca de 46 mil policiais, segundo o Fórum de Segurança Pública - Anuário 2010, que recebem em sua grande maioria um salário líquido de 950 reais e são submetidos a jornadas exaustivas, onde suas vidas são postas a prova diariamente. Somente este ano mais de 60 policiais foram mortos. Sendo expostos a tão severo cotidiano, muitos procuram uma válvula de escape, principalmente em drogas lícitas e ilícitas, além propiciar ainda mais condutas omissas e corruptas diante de fatos irregulares.
O atual Secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, depara-se com uma realidade nefasta: dentro desses 46 mil policiais, muitos estão envolvidos em condutas irregulares, atitudes como a dos policiais do caso Afroreggae ou do caso Rafael Mascarenhas são corriqueiras. É preciso, portanto, haver um divisor de águas nessa nova política de segurança do Rio de Janeiro, acompanhado a expansão das UPPs e dos projetos sociais e de urbanização dos morros cariocas, faz-se necessário uma reestruturação radical das policias do Estado, assim como houve em Nova York. Isso envolve aspectos que vão do salário médio pago aos policiais até a expulsão mediante processo criminal e administrativo dos envolvidos em práticas delituosas. Além disso, a criação de uma Corregedoria Externa para as forças policiais é essencial nesse processo. Como dissera Calos Drummond de Andrade: “no meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho”.
João Victor Rabelo é pesquisador do Laboratório de Estudos e Pesquisas da Conflitualidade e Violência (COVIO) da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Estudante de Ciências Sociais da UECE e de Direito da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Bolsista do Progama de Educação Tutorial (PET) do Ministério da Educação (MEC).
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
Hidrelétrica de Belo Monte: a terceira invasão do Xingu
Cinco décadas depois, Benedito dos Santos recorda as batalhas das quais participou como um dos seringueiros que invadiram, desde o final do Século XIX, as florestas da Bacia do Rio Xingu, na Amazônia oriental, enfrentando a resistência de alguns grupos indígenas e convivendo e se misturando com outros.
Aos 67 anos, com 23 filhos dos 26 que teve com 14 mulheres, “Bião”, como é conhecido, trabalha de barqueiro na empresa familiar que tem, com oito embarcações e um atracadouro no centro de Altamira, a principal cidade às margens do Xingu, com cerca de cem mil habitantes. Ele viveu todos os ciclos da economia extrativista desta Bacia, desde que chegou, antes de completar cinco anos, com sua mãe já viúva e três irmãos menores, procedentes do Rio Moju, 350 quilômetros a leste, também no Estado do Pará, no Norte do Brasil.
Diante das transformações que serão causadas pela hidrelétrica de Belo Monte (que represará o Rio Xingu em dois pontos, inundando ilhas, florestas e terras agrícolas), Bião diz estar “neutro”. A decisão é dos poderosos, não importa a controvérsia entre defensores e opositores da obra, afirma. Só espera que seja gerada renda para a população local carente de emprego, e reconhece que já não tem o protagonismo de antes, quando dependia da natureza para sobreviver.
“Fui criado com leite de pau”, brinca para ressaltar que em criança aprendeu a tirar o látex da seringueira, além de ajudar a mãe e o padrasto na agricultura. Virou seringueiro com 14 anos, se embrenhando nas florestas do Médio Xingu com três grupos, quando já esperava seu primeiro filho, após ter se dedicado a colher castanhas.
Aquele ataque à aldeia foi resposta a sucessivos assassinatos de seringueiros, cometidos por índios que, dessa forma, conseguiam armas de fogo, afirma Bião. “Só no grupo do Isaac, mataram mais de 40”, assegura. Mas a matança era recíproca. Os brancos acrescentavam um rito macabro: enfiavam “pedras no bucho” dos cadáveres para escondê-los no fundo do rio e evitar a repressão do Serviço de Proteção ao Índio.
Bião sentia cada vez mais medo, inclusive pelas disputas internas. Uma tarde, começou um tiroteio entre os seringueiros do acampamento, com vários mortos. Ele evitava conflitos e desfrutava da proteção de seus patrões por sua habilidade para caçar, que o fez fornecedor de carne e pescado para seus companheiros.
No cerco à aldeia indígena, após nove dias de marcha durante a qual desertaram dez dos 35 homens mobilizados, o chefe o colocou “atrás de um tronco de embaúba, tão fino que não aguentaria as balas”, recorda. Atemorizado, passou a noite toda cavando um buraco usando “as unhas como enxada”.
O medo e o barulho do tiroteio fizeram com que muitos homens desperdiçassem munição. Substituíam cartuchos intactos, convencidos de que haviam disparado, conta Bião. Vários índios morreram e apenas dois seringueiros ficaram feridos, recorda. A aldeia foi incendiada. Depois de nove anos no seringal e já com quatro filhos, voltou à “boa vida” de Altamira. Além de perigosa, a atividade tinha pouco futuro.
A Amazônia brasileira, que enriqueceu com a extração de borracha no final do Século XIX e começo do XX, a partir de 1920 perdeu o domínio do mercado mundial para a Malásia, onde as plantações de seringueiras (Hevea brasiliensis) alcançaram rendimentos maiores.
Bião e seus companheiros se beneficiaram dos bons preços do pós-guerra, mas o Brasil já havia caído para exportador secundário, dependente de subsídios e eventuais bolhas de demanda, como por ocasião da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando o Japão bloqueou as exportações do sudeste asiático.
A “caça do gato” (onça), e de outros animais de couro apreciados no mercado, passou de atividade intermitente a principal fonte de renda para Bião. “Foi quando ganhei mais dinheiro”, suficiente para comprar terrenos na cidade, disse. “Uma noite matei 30 jacarés, mas, eu e dois companheiros, não conseguimos tirar o couro de todos. Dá muito trabalho”, contou. Agora, restam poucos desses animais nas proximidades de Altamira, porque “as pessoas os matam para comer”, mas continuam abundantes nas lagoas do Alto Xingu, acrescentou. Em 1967, uma lei proibindo a caça restringiu a atividade, embora sua vigência na Amazônia seja relativa.
Bião também participou da construção da malograda rodovia Transamazônica, iniciada em 1970. Dedicou um ano a derrubar floresta para dar lugar ao projeto de três mil quilômetros de extensão, destinado a unir o Nordeste à Amazônia. A estrada, sem asfalto, é quase intransitável nos trechos que servem Altamira. A obra atraiu uma nova onda migratória para a Amazônia, estimulada por promessas e distribuição de terras a camponeses.
Aparecida Moraes é filha desse processo. Nasceu em 1971, um ano após sua família chegar do Estado do Paraná, no Sul, “buscando terras”, e acabou assentada na margem direita do Rio Xingu. Hoje, casada com outro migrante do Paraná, vende banana, papaia e cereais na Feira do Produtor, no centro de Altamira. Suas terras não serão inundadas por Belo Monte.
Esta sorte não terá Sebastião de Castro Silva, de 60 anos e oito filhos, que cultiva cacau e cereais nos cem hectares que obteve após chegar à Amazônia em 1977, procedente de Goiás. “Vou embora da Amazônia se construírem a represa”, pois vai inundar 40% de sua propriedade, impedindo de “manter juntos” seus 32 familiares.
Enquanto ocorria esta invasão camponesa do Médio e Baixo Xingu, na década de 70, Bião dedicou-se ao garimpo. Foi à Venezuela em busca de diamantes, mas logo foi detido e deportado, junto com outros garimpeiros brasileiros. Descobriu ouro em Ressaca, perto de Altamira, em uma mina onde ainda trabalham alguns de seus descendentes, e esteve por vários garimpos, até escolher um no alto da Bacia do Rio Tapajós, paralelo ao Xingu, mais de mil quilômetros ao sul de Altamira, no central Estado do Mato Grosso.
“No garimpo se ganha muito, mas também se perde muito, inclusive a vergonha, entre bebidas e putas”, lamenta Bião. Por 18 anos, até 2002, Bião explorou vários barrancos (áreas de garimpo) e um prostíbulo, mas também trabalhou para uma madeireira, a Marajoara. A extração ilegal de madeira ainda prosperava, sobretudo de mogno, árvore preciosa cuja exploração está restringida desde 1996.
As disputas eram violentas. Uma floresta de mognos no alto de uma montanha, onde Bião chegara com sua equipe e seus tratores, despertou a cobiça de um grupo competidor, cujo iminente ataque armado foi frustrado com uma emboscada na qual morreram mais de 20 adversários. Bião teve de fugir. “Minha cabeça valia cinco quilos de ouro”, explicou. Voltou a Altamira, atraído por seus filhos.
Já a vida de barqueiro, em um Xingu povoado de ilhotas submersas e quedas d’água ocultas nas cheias, também tem seus riscos. Há dois meses, Bião sentiu que o mundo “escurecia muito rapidamente”, quando um redemoinho o tragou juntamente com sua “voadora”, pequeno barco a motor que “voa” sobre as águas. Sobreviveu nadando mais de uma hora e ficando em cima de uma árvore por outras 11 em meio à correnteza.
É sobrevivente de um modo de vida que, como o Rio Xingu, se desfigurará com a construção da hidrelétrica de Belo Monte nos próximos cinco anos. As obras empregarão 18.700 trabalhadores e gerar 80 mil empregos indiretos, com uma previsão de que atrairão cerca de cem mil migrantes para municípios que não têm mais do que 150 mil habitantes. Além disso, por fim, a Transamazônica será asfaltada, rompendo um relativo isolamento do Médio Xingu.
Um empresário de Goiânia, capital do Estado de Goiás, 2.300 quilômetros ao sul por rodovia, começou, há pouco tempo, a comprar pescado em Altamira, que transporta em caminhão em quantidades de 600 a 800 quilos até sua cidade, segundo Gilvan de Almeida, que há 12 anos vende pescado na Feira do Produtor. Com asfalto, Altamira se integrará ao resto do país e, provavelmente, haja o desenvolvimento da pesca industrial no Xingu, afetando o abastecimento local e a abundância de peixes neste grande rio e em seus afluentes.
Fonte: IPS-Inter Press Service International Association (Roma).
quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
Apesar do recuo do tráfico, especialistas alertam contra euforia
Apesar do inegável apoio popular à ação da polícia, especialistas alertam que o otimismo excessivo - muitas vezes insuflado por setores da mídia interessados em não desvalorizar a “marca Rio” às vésperas da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 - pode mascarar uma realidade onde permanece evidente o longo caminho que ainda resta a ser percorrido para que o Rio possa realmente viver em paz. "Temos ainda no Rio de Janeiro centenas de comunidades controladas pelo tráfico ou pela milícia. O quadro é complexo, e as avaliações que estão sendo feitas são de um triunfalismo fora de tom”, diz Ignacio Cano, sociólogo e professor da Uerj. A reportagem é de Maurício Thuswohl.
Rio de Janeiro – A ocupação pelas forças do Estado das favelas na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão, consideradas até então duas fortalezas inexpugnáveis do tráfico de drogas no Rio de Janeiro, fez nascer na sociedade brasileira - e entre os cariocas em particular - a sensação de que os traficantes estão finalmente sendo enfrentados com seriedade pelo poder público. Mas, apesar do inegável apoio popular à ação da polícia, especialistas alertam que o otimismo excessivo - muitas vezes insuflado por setores da mídia interessados em não desvalorizar a “marca Rio” às vésperas da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 - pode mascarar uma realidade onde permanece evidente o longo caminho que ainda resta a ser percorrido para que o Rio possa realmente viver em paz.
Sociólogo, professor da Uerj e especialista em segurança pública, Ignacio Cano avalia que existe um otimismo exagerado após o recuo dos traficantes: “Definitivamente, eu acho que boa parte da imprensa e um setor da sociedade interpretaram o fato como se fosse a vitória final contra o tráfico de drogas. Essa é uma visão muito simplista, porque não há uma guerra e, portanto, não vai haver uma rendição. Temos ainda no Rio de Janeiro centenas de comunidades controladas pelo tráfico ou pela milícia. O quadro é complexo, e as avaliações que estão sendo feitas são de uma simplicidade e de um triunfalismo fora de tom”.
Ex-membro do Ministério Público e deputado estadual reeleito, Marcelo Freixo (PSOL-RJ) comemora o momento atual, mas também faz ressalvas: “O otimismo se dá em função de um território - que é dos mais complicados e um espaço onde havia uma grande concentração de armas e onde uma determinada facção do varejo da droga tinha muita força - ter sido efetivamente dominado pelo Estado através de suas parcerias políticas com o governo federal. Agora, daí a afirmar que os problemas de segurança pública no Rio estão resolvidos, eu diria que é mais do que euforia, é um tanto fraude”.
O deputado lembra que a venda de maconha, cocaína e outras drogas no varejo realizada nas favelas é apenas uma das pontas de atuação do narcotráfico: “O tráfico internacional que levou tantas armas e tantas drogas ao Rio de Janeiro não está afetado. Esse comércio internacional passa por lugares que não são as favelas, como a Baía de Guanabara, os aeroportos clandestinos ou estradas menos vigiadas. Não existem grandes ações no sentido de coibir esse tráfico de armas e drogas de forma sistemática”, diz.
Outra preocupação demonstrada pelos especialistas diz respeito aos desdobramentos das ocupações do Complexo do Alemão e da Vila Cruzeiro, uma vez que o número de traficantes em todo o Rio é sabidamente bem maior do que os 600 homens armados com fuzis que, segundo estimativas da Secretaria de Segurança Pública, se concentram nos dois maiores bunkers da facção criminosa Comando Vermelho.
O governador Sérgio Cabral confirmou nesta segunda-feira (30) o pedido feito ao Ministério da Defesa para que forças federais permaneçam nas duas favelas até a instalação nos locais de novas Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) previstas para o primeiro semestre de 2011: “O apoio do Ministério da Defesa vai permitir a transição até a chegada da UPP”, disse.
Para Cano, não resta outra alternativa à polícia que não seja permanecer por tempo indeterminado nas duas favelas: “Agora a polícia não pode sair porque, se os policiais saírem, vão ficar completamente desmoralizados, vai parecer que tudo não passou de um exercício de pirotecnia e daqui a dois anos teremos uma nova invasão do Alemão. Eu acho que agora a polícia tem que ficar, mas não sei como vão fazer, pois na verdade as ocupações não estavam planejadas e é preciso um contingente relativamente grande para mantê-las. A Secretaria de Segurança Pública também não tinha ainda o plano de uma UPP para o Alemão, então é uma incógnita o que vai acontecer. O certo é que, se saírem de lá, os policiais ficarão completamente desmoralizados”.
Ocupação social
A antropóloga Alba Zaluar, que estuda a região da Penha e do Complexo do Alemão há décadas, afirma em artigo publicado no jornal O Globo que “não há como não entender a celebração de vitória”, mas também demonstra inquietação: “Ainda há muitas dúvidas sobre o que irá acontecer depois. As tropas vão embora, como já aconteceu outras vezes no passado? Os governos federal, estadual e municipal vão realmente melhorar os serviços precários antes existentes, dando mais sentido à palavra cidadão?”, escreveu.
A chamada “ocupação social” das comunidades também é defendida por Marcelo Freixo: “A gente tem que aproveitar esse momento onde os moradores das favelas disseram sim e foram fundamentais para a ocupação do Estado e a aproximação das forças policiais para discutir um novo papel para as favelas no Rio de Janeiro, que não seja o papel somente das ações bélicas do Estado. Que a favela possa ser protagonista de uma outra concepção de cidade. A chamada ocupação social pelo Estado até agora não aconteceu sequer nas UPPs, algumas já com dois anos. O momento é favorável, mas desde que tenha um desencadeamento mais ousado do que se teve até agora por parte do poder público”, diz o deputado.
Ignacio Cano lembra que existe um projeto do governo estadual chamado UPP Social, mas que ele não é suficiente: “A ocupação tem de ser complementada com política social. Mas, a gente também cobra do governo que os investimentos não sejam feitos exclusivamente dentro das áreas com UPPs, mas que sejam levados também para todas as comunidades pobres”, afirma o sociólogo.
Forças Armadas
A participação das Forças Armadas no apoio à ocupação da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão também foi analisada pelos especialistas em segurança pública: “O papel das Forças Armadas é a defesa nacional e não a segurança pública. Os países que chamaram as Forças Armadas para o combate ao narcotráfico, como é o caso do México, se deram muito mal porque não resolveram o problema e ainda por cima colocaram o Exército numa situação muito difícil. Agora, se as Forças Armadas podem repassar inteligência e emprestar equipamentos como os veículos blindados, acho que podem ter uma função de apoio desde que não haja a participação de militares em ações de segurança pública” opina Cano.
Freixo defende uma participação parcial das forças federais, em consonância com as polícias estaduais: “Eu acho que tanto as Forças Armadas quanto a Policia Federal devem agir no Rio de Janeiro de forma articulada com as autoridades de segurança pública do Rio de Janeiro. Não em uma intervenção, não com tanques. Eu acho que uma parceria em produção de inteligência - principalmente no que cabe às forças federais, que é o enfrentamento ao tráfico de armas – poderia ser importante nos aeroportos clandestinos, na Baía de Guanabara”.
O deputado defende as ações conjuntas: “É preciso ter um projeto de parceria entre as forças federais e o Governo do Estado para o enfrentamento do tráfico internacional tanto de armas quanto de drogas. Principalmente o tráfico de armas, que é o que diferencia o Rio de Janeiro de outras cidades”, diz. Freixo também afirma que o momento é de qualificar o trabalho do policial: “É preciso aproveitar a auto-estima da polícia neste momento para discutir a estrutura e o papel dessa polícia, o salário dos policiais, a sua formação e tantas outras coisas que precisam ser discutidas”.
domingo, 9 de janeiro de 2011
DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS ENTRE A ROTA E O BOPE
por Décio Leão, Cap PMESP
BOPE e ROTA são unidades policiais muito diferentes, com místicas semelhantes.
A ROTA (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) não é uma unidade de operações especiais, se vista dentro do conceito geral de operações especiais. Em São Paulo, as únicas unidades que podem ser consideradas de operações especiais (dentro do conceito doutrinário) é o COE (Comandos e Operações Especiais) e o GATE (Grupo de Ações Táticas Especiais). Ambos são Companhias do 3º Batalhão de Polícia de Choque.
ROTA é o serviço executado pelo 1º Batalhão de Polícia de Choque “Tobias de Aguiar”, que compreende patrulhamento ostensivo motorizado em apoio às unidades de policiamento territorial. A ROTA atua na chamada “saturação” do policiamento em pontos críticos e seu foco é o patrulhamento nas ruas e avenidas, abordando carros e pessoas suspeitas, além de apoiar as outras viaturas em ocorrências de maior gravidade, como roubos.
As patrulhas (ou equipes) de ROTA são compostas por 4 policiais, sob comando de um sargento, que atuam sempre embarcadas em uma viatura tipo Blazer. A rotina da ROTA é o patrulhamento motorizado, sendo que as incursões em favelas e outras áreas de risco são feitas em decorrência do patrulhamento e não como uma ação específica, como ocorre com o BOPE. No BOPE, a viatura é apenas um meio de transporte para a patrulha, que atua basicamente realizando incursões a pé nas favelas.
O treinamento da ROTA é também diferente do BOPE. O foco do treinamento da ROTA é a abordagem e busca em veículos e pessoas, identificação veicular, legislação e outros assuntos de policiamento, enquanto que o BOPE é forte nas condutas de patrulhas a pé e combate urbano. Não há um “curso de ROTA” obrigatório e o policial é selecionado a partir da sua conduta diária na unidade, experiência em policiamento e comportamento disciplinar.
Apesar dessas diferenças, a ROTA tem uma mística muito forte, talvez até mais antiga do que o BOPE. Os símbolos da ROTA (a boina preta e o braçal de couro com as letras R-O-T-A douradas) são venerados assim como a caveira é para o BOPE. Na unidade, até se fala em “policial DA ROTA” (aquele que apenas serve na unidade) e o “policial DE ROTA” (aquele que realmente internaliza os valores e a mística da unidade). Assim como no BOPE, os policiais da ROTA têm uma história de luta, combates, sangue e muita dedicação ao serviço. Nesse ponto, pode-se dizer que ROTA e BOPE são unidades-irmãs.