O Sistema Penitenciário brasileiro abriga atualmente mais de 500 mil presos e possui apenas cerca de 300 mil vagas em estabelecimentos penais, além dos presos que cumprem pena em delegacias e os que estão em regime aberto.
A população carcerária do Ceará, em dezembro de 2010, era de 15.201 presos segundo dados do Sistema Integrado de Informações Penitenciários – InfoPen – vinculado ao Departamento Penitenciário Nacional e ao Ministério da Justiça. No entanto, segundo dados da Secretaria de Justiça e Cidadania doCeará estão disponíveis 10.205 vagas nos estabelecimentos prisionais, ou seja, existe um déficit de quase cinco mil vagas no Sistema Penitenciário.
Atualmente, a população carcerária ultrapassa os 18 mil presos. Assim, os usuários deste Sistema ficam submetidos à situação subumana, sofrendo diversos problemas em função da falta de estrutura e de profissionais.
Dentre estes problemas vale ressaltar a má-alimentação dos presos, seu sedentarismo, uso de drogas, a falta de higiene, de profissionais da saúde e da segurança, e toda a lugubridade da prisão, fazendo com que o preso que ingresse no Sistema Prisional não saía sem ser acometida de doenças ou coloque em risco sua resistência física. Dentre as doenças mais comuns, destacam-se a tuberculose e a hepatite, além de doenças venéreas como a AIDS. Conforme pesquisas realizadas nas prisões, estima-se que 20% dos presos brasileiros sejam portadores do vírus HIV, principalmente em decorrência da violência sexual praticada por outros presos e do uso de drogas injetáveis. Além disso, os presos sofrem por vezes abusos e agressões advindas dos agentes públicos a exemplo do caso do “massacre” do Carandiru em São Paulo, no ano de 1992, no qual foram oficialmente executados 111 presos.
De encontro a este quadro estão as garantias legais previstas durante a execução da pena, assim como os direitos fundamentais do preso que estão previstos em diversos estatutos legais. Em nível global existe a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e a proteção das garantias do homem preso.
Diante disso, discutimos a viabilidade da privatização do ponto de vista ético, jurídico e após o texto constitucional. O modelo privado começou a ser adotado em outros países desde o início da década de 1990, especialmente nos Estados Unidos, lá o preso custa ao Estado em média 25 mil dólares por ano, ou seja, mais de 4 mil reais por mês. O custo dos presos no Brasil é bastante variável, no Ceará é de 1.600 reais, já no Sistema Penitenciário Federal é de aproximadamente 3 mil reis. No entanto, neste último nunca se registrou fugas, rebeliões ou mortes de presos, os funcionários são servidores públicos federais de carreira, que percebem remuneração atraente, a estrutura das penitenciárias federais são de alto nível, utilizando-se da tecnologia mais avançada, haja vista que abrigam os presos mais perigosos do Brasil.
No modelo privado, o Estado paga pela construção e a manutenção da prisão, destinando recursos ao custeio de cada preso. Assim, verifica-se que a entidade privada estará mais preocupada em otimizar os custos com a manutenção do preso, mesmo que isso implique na precarização da alimentação, de seus funcionários, que ganharão menos do que os servidores concursados, das obras de reforma da unidade penal etc. Além disso, os casos de privatização no Sistema Penitenciário do Ceará revelam que a privatização ou terceirização dos presídios é extremamente superfaturada e quem lucra com isso são poucos, normalmente quem vence as licitações estão envolvidos com a troca de favores políticos, bem como em escândalo de desvio de verbas públicas.
No Ceará, entre 2000 e 2002, houve a privatização dos presídios, que foram delegados a Companhia Nacional de Administração Prisional – CONAP, o custo médio do preso à época custodiado pela empresa era de 920 reais, enquanto isso, a dos presídios administrados pelo Estado eram de 650 reais. A CONAP administrava apenas três presídios, o que representava 10% dos presos do Ceará, mesmo assim, recebia 48% dos recursos destinados a manutenção da população carcerária cearense, que era da ordem de 11,5 mil pessoas em 2002.
Além do superfaturamento dos presídios terceirizados, o Ministério Público Federal apurou que houve fraudes às licitações, contratos de terceirização ou co-gestão prisional, sem qualquer respaldo legal, o que ia de encontro a Resolução 08/2002 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) e o Ministério Público do Trabalho verificou que houve o não pagamento de direitos trabalhistas aos funcionários da CONAP, a saber: vale alimentação, adicional de periculosidade, horas-extras etc.
Os funcionários terceirizados diferente dos selecionados por concurso público, que têm estabilidade, são sujeitos a rescisão de contrato a qualquer tempo, tendo medo de dispensa. Isso não quer dizer que o servidor público não esteja sujeito a demissão, haja vista que existem inúmeros órgãos responsáveis pela fiscalização e no Governo Lula nunca se demitiu tanto servidor público por irregularidades. No entanto, tais servidores estão sujeitos ao contraditório e a ampla defesa garantidos pelo devido processo legal, enquanto isso, os terceirizados não estão sujeitos a tais direitos. A greve, por exemplo, que é um direito trabalhista, os funcionários terceirizados estão alijados, pois teme a demissão sumária. Isso prejudica os serviços, pois aumenta a rotatividade dos profissionais e prejudica o trabalho prestado por eles, já que não têm autonomia funcional.
Diante disso, em 2002, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública feita pelos procurados da República Alessander Sales e Nilce Cunha, pedindo a substituição da estrutura financeira, humana e material da CONAP pelo Estado do Ceará, onde este devia se abster de contratar qualquer empresa privada para execução de serviços penitenciários. A ação também foi assinada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), secção Ceará. Segundo o documento, “uma vez que os seus fins institucionais não se restringem à defesa de direito próprio e de seus associados, comportando também a defesa da Constituição, da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos, da justiça social, da boa aplicação das leis.
Além disso, a Execução Penal disciplinada pela Lei de Execuções Penais - Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, atribui ao Estado oacompanhamento do cumprimento da pena e o disciplinamento dos internos, portando, caracteriza-se a atividade de Segurança Penitenciária como uma atividade típica de Estado, não sendo possível a delegação a terceiros. Isso é justificado em função de somente o servidor público de carreira, representante do Estado, poder utilizar dos meios coercitivos, haja vista que o Estado detém o monopólio da violência em razão da prática de condutas ilícitas. Desse modo, qual respaldo teria o funcionário terceirizado em apreender ilícitos dentro da unidade penal? Não teria, pois o jus puniendi ou direito de punir é exclusivo do Estado. Portanto, os funcionários terceirizados estariam usurpando uma função pública e atuando de modo ilegal.
Com isso, a privatização carcerária parece à primeira vista uma solução para desafogar a superlotação das prisões brasileiras e dar a eles o mínimo de dignidade no cumprimento da pena de prisão. No entanto, essa medida esconde esquemas de superfaturamento nas licitações, precarização dos trabalhadores penitenciários, esquemas de desvio de verbas públicas, dentre outros aspectos negativos.
Atualmente as prisões brasileiras já têm a maioria dos serviços penitenciários terceirizados. No Ceará, os médicos, psicólogos, educadores, enfermeiros, motoristas, auxiliar de serviços gerais, dentre outros funcionários, são admitidos pelos contratos de terceirização e, portanto, tais serviços já são administrados pela iniciativa privada. No entanto, alguns que defendem a privatização querem ampliar isso para a segurança penitenciária, que é uma atividade típica do Estado e concedida por lei ao cargo de agente penitenciário, portanto, terceiros sem vínculos com o Estado não podem prestá-los, devendo passar por concurso público, exigindo do candidato além das provas escritas, exame psicológico, físico, toxicológico, médico, odontológico, bem como curso de formação profissional com conteúdo e carga horária disciplinada pelo Ministério da Justiça.
REFERÊNCIAS
Artigo “A realidade atual do Sistema Penitenciário Brasileiro” de Rafael Damasceno de Assis publicado na Revista CEJ, Brasília, Ano XI, n.39, p.74-78, out/dez. 2007.
Revista Escola. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/ensino-medio/privatizacao-698327.shtml>. Acesso em: 14.04.2013
Portal Sobral de Notícias: <http://www.sobralportaldenoticias.com/v1/2011/05/27/ce-sistema-carcerarionecessita-de-politicas-urgentes> Acesso em: 11.04.2013
http://noticias.pgr.mpf.gov.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_geral/mpf-ce-acao-contra-privatizacaodos-presidios-sera-intensificada-com-completa-investigacao
Denúncia do Ministério Público do Trabalho em face da violação dos direitos trabalhistas realizados CONAP - http://www.prt7.mpt.gov.br/portarias_icivil/2009/abril/sede/530-2009.pdf
A população carcerária do Ceará, em dezembro de 2010, era de 15.201 presos segundo dados do Sistema Integrado de Informações Penitenciários – InfoPen – vinculado ao Departamento Penitenciário Nacional e ao Ministério da Justiça. No entanto, segundo dados da Secretaria de Justiça e Cidadania doCeará estão disponíveis 10.205 vagas nos estabelecimentos prisionais, ou seja, existe um déficit de quase cinco mil vagas no Sistema Penitenciário.
Atualmente, a população carcerária ultrapassa os 18 mil presos. Assim, os usuários deste Sistema ficam submetidos à situação subumana, sofrendo diversos problemas em função da falta de estrutura e de profissionais.
Dentre estes problemas vale ressaltar a má-alimentação dos presos, seu sedentarismo, uso de drogas, a falta de higiene, de profissionais da saúde e da segurança, e toda a lugubridade da prisão, fazendo com que o preso que ingresse no Sistema Prisional não saía sem ser acometida de doenças ou coloque em risco sua resistência física. Dentre as doenças mais comuns, destacam-se a tuberculose e a hepatite, além de doenças venéreas como a AIDS. Conforme pesquisas realizadas nas prisões, estima-se que 20% dos presos brasileiros sejam portadores do vírus HIV, principalmente em decorrência da violência sexual praticada por outros presos e do uso de drogas injetáveis. Além disso, os presos sofrem por vezes abusos e agressões advindas dos agentes públicos a exemplo do caso do “massacre” do Carandiru em São Paulo, no ano de 1992, no qual foram oficialmente executados 111 presos.
De encontro a este quadro estão as garantias legais previstas durante a execução da pena, assim como os direitos fundamentais do preso que estão previstos em diversos estatutos legais. Em nível global existe a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e a proteção das garantias do homem preso.
Diante disso, discutimos a viabilidade da privatização do ponto de vista ético, jurídico e após o texto constitucional. O modelo privado começou a ser adotado em outros países desde o início da década de 1990, especialmente nos Estados Unidos, lá o preso custa ao Estado em média 25 mil dólares por ano, ou seja, mais de 4 mil reais por mês. O custo dos presos no Brasil é bastante variável, no Ceará é de 1.600 reais, já no Sistema Penitenciário Federal é de aproximadamente 3 mil reis. No entanto, neste último nunca se registrou fugas, rebeliões ou mortes de presos, os funcionários são servidores públicos federais de carreira, que percebem remuneração atraente, a estrutura das penitenciárias federais são de alto nível, utilizando-se da tecnologia mais avançada, haja vista que abrigam os presos mais perigosos do Brasil.
No modelo privado, o Estado paga pela construção e a manutenção da prisão, destinando recursos ao custeio de cada preso. Assim, verifica-se que a entidade privada estará mais preocupada em otimizar os custos com a manutenção do preso, mesmo que isso implique na precarização da alimentação, de seus funcionários, que ganharão menos do que os servidores concursados, das obras de reforma da unidade penal etc. Além disso, os casos de privatização no Sistema Penitenciário do Ceará revelam que a privatização ou terceirização dos presídios é extremamente superfaturada e quem lucra com isso são poucos, normalmente quem vence as licitações estão envolvidos com a troca de favores políticos, bem como em escândalo de desvio de verbas públicas.
No Ceará, entre 2000 e 2002, houve a privatização dos presídios, que foram delegados a Companhia Nacional de Administração Prisional – CONAP, o custo médio do preso à época custodiado pela empresa era de 920 reais, enquanto isso, a dos presídios administrados pelo Estado eram de 650 reais. A CONAP administrava apenas três presídios, o que representava 10% dos presos do Ceará, mesmo assim, recebia 48% dos recursos destinados a manutenção da população carcerária cearense, que era da ordem de 11,5 mil pessoas em 2002.
Além do superfaturamento dos presídios terceirizados, o Ministério Público Federal apurou que houve fraudes às licitações, contratos de terceirização ou co-gestão prisional, sem qualquer respaldo legal, o que ia de encontro a Resolução 08/2002 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) e o Ministério Público do Trabalho verificou que houve o não pagamento de direitos trabalhistas aos funcionários da CONAP, a saber: vale alimentação, adicional de periculosidade, horas-extras etc.
Os funcionários terceirizados diferente dos selecionados por concurso público, que têm estabilidade, são sujeitos a rescisão de contrato a qualquer tempo, tendo medo de dispensa. Isso não quer dizer que o servidor público não esteja sujeito a demissão, haja vista que existem inúmeros órgãos responsáveis pela fiscalização e no Governo Lula nunca se demitiu tanto servidor público por irregularidades. No entanto, tais servidores estão sujeitos ao contraditório e a ampla defesa garantidos pelo devido processo legal, enquanto isso, os terceirizados não estão sujeitos a tais direitos. A greve, por exemplo, que é um direito trabalhista, os funcionários terceirizados estão alijados, pois teme a demissão sumária. Isso prejudica os serviços, pois aumenta a rotatividade dos profissionais e prejudica o trabalho prestado por eles, já que não têm autonomia funcional.
Diante disso, em 2002, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública feita pelos procurados da República Alessander Sales e Nilce Cunha, pedindo a substituição da estrutura financeira, humana e material da CONAP pelo Estado do Ceará, onde este devia se abster de contratar qualquer empresa privada para execução de serviços penitenciários. A ação também foi assinada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), secção Ceará. Segundo o documento, “uma vez que os seus fins institucionais não se restringem à defesa de direito próprio e de seus associados, comportando também a defesa da Constituição, da ordem jurídica do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos, da justiça social, da boa aplicação das leis.
Além disso, a Execução Penal disciplinada pela Lei de Execuções Penais - Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, atribui ao Estado oacompanhamento do cumprimento da pena e o disciplinamento dos internos, portando, caracteriza-se a atividade de Segurança Penitenciária como uma atividade típica de Estado, não sendo possível a delegação a terceiros. Isso é justificado em função de somente o servidor público de carreira, representante do Estado, poder utilizar dos meios coercitivos, haja vista que o Estado detém o monopólio da violência em razão da prática de condutas ilícitas. Desse modo, qual respaldo teria o funcionário terceirizado em apreender ilícitos dentro da unidade penal? Não teria, pois o jus puniendi ou direito de punir é exclusivo do Estado. Portanto, os funcionários terceirizados estariam usurpando uma função pública e atuando de modo ilegal.
Com isso, a privatização carcerária parece à primeira vista uma solução para desafogar a superlotação das prisões brasileiras e dar a eles o mínimo de dignidade no cumprimento da pena de prisão. No entanto, essa medida esconde esquemas de superfaturamento nas licitações, precarização dos trabalhadores penitenciários, esquemas de desvio de verbas públicas, dentre outros aspectos negativos.
Atualmente as prisões brasileiras já têm a maioria dos serviços penitenciários terceirizados. No Ceará, os médicos, psicólogos, educadores, enfermeiros, motoristas, auxiliar de serviços gerais, dentre outros funcionários, são admitidos pelos contratos de terceirização e, portanto, tais serviços já são administrados pela iniciativa privada. No entanto, alguns que defendem a privatização querem ampliar isso para a segurança penitenciária, que é uma atividade típica do Estado e concedida por lei ao cargo de agente penitenciário, portanto, terceiros sem vínculos com o Estado não podem prestá-los, devendo passar por concurso público, exigindo do candidato além das provas escritas, exame psicológico, físico, toxicológico, médico, odontológico, bem como curso de formação profissional com conteúdo e carga horária disciplinada pelo Ministério da Justiça.
REFERÊNCIAS
Artigo “A realidade atual do Sistema Penitenciário Brasileiro” de Rafael Damasceno de Assis publicado na Revista CEJ, Brasília, Ano XI, n.39, p.74-78, out/dez. 2007.
Denúncia do Ministério Público do Trabalho em face da violação dos direitos trabalhistas realizados CONAP - http://www.prt7.mpt.gov.br/portarias_icivil/2009/abril/sede/530-2009.pdf